O projeto se apresenta como uma estratégia de pensar a arte como um deslocamento da produção do campo estritamente específico de suas linguagens para o ambiente ampliado das relações culturais.
Articula-se através de dois eixos:
Primeiro uma abordagem teórica a partir do conceito de “deslocamento” e suas diversas conceituações, que permeia o campo da estética contemporânea.
Deslocamento indica mudar de direção, desviar, desarticular, afastar, tirar do lugar, transferir, decompor, desconjuntar, desarticular.
Para esta leitura tomaremos como marco os deslocamentos efetuados palas vanguardas históricas no inicio do século xx e seus desdobramentos na arte contemporânea, ao deslocarem o próprio sentido da arte, trazendo para o domínio da vida, colocando-se como reação a uma ideologia dominante.
A arte estende e entrecruza sua linguagem desloca-se em permanência, cria novos lugares para se experimentar, propostas artísticas que visam investir no mundo, de maneira concreta ou metafórica, expandindo-se em direção à cidade, sob forma de intervenções, performances e happenings.
A relação espectador/obra assume novos aspectos quando a arte sai do espaço habitual dos museus e galerias para acontecer também no espaço urbano, na paisagem, na natureza.
Certamente, podemos situar esse momento numa dinâmica de ‘autonomia radical’ da arte em relação ao próprio sistema que, então a sustentava; uma interrogação de seus preceitos, de seus limites físicos e conceituais, de maneira distinta, mas filiada ao gesto duchampiano do início do século XX.
1-Marcel Duchamp e o Readymades:
O gesto de Duchamp, que desloca um objeto de uso cotidiano (readymades) e o esvazia de seu sentido original, conferindo-lhe o estatuto de objeto artístico, traz consigo um significativo deslocamento da própria questão: O que é arte?
“Roda de bicicleta” (1913) “Suporte de garrafas” (1914) “Fonte” (1917) e tantos outros ready mades trouxeram para o fazer artístico os objetos e materiais do cotidiano, fabricados numa sociedade voltada para o consumo. O objeto pronto trazia a desmistificação da obra de arte única, original e sacralizada.
2-Kurt Schwitters e os Merz art.
Merzbau pode ser considerada a primeira instalação artística, onde roupas,
cabelos e garrafas com urina, eram guardados em caixas e malas e presos às paredes
O primeiro de seus três grandes trabalhos de ocupação espacial, datado de 1923, foi
chamado, primeiramente, Die Kathedrale des Erotischen Elends (Catedral da Miséria
Erótica), e depois batizado como Merzbau , que é o mesmo que 'casa Merz'. Merzbau
era uma combinação de colagem, escultura e arquitetura que começou ocupando um
canto do ateliê de Schwitters e foi gradualmente expandida para oito cômodos de sua
casa em Hannover.
.As Conseqüências das pesquisas de Kurt Schwitters podem ser observadas na produção de artistas que emergem a partir de meados da década de 1950, como a pop art. e a arte povera.
3- Pollock e action Paining
A pintura de ação exigia que a tela fosse colocada sobre o chão, e que o pintor se movimentasse vigorosamente sobre ela. O gesto pictórico, antes restrito á mão, agora se estendia ao corpo inteiro. A tela então se converte em palco e o artista em ator.
Essa nova poética baseia-se num deslocamento físico, do próprio corpo do artista em ação.
O processo é o foco de concentração do artista, assim que os gestos de liberdade que deslocam a relação da arte com o projeto, o pré-concebido, colocando-a em relação direta com o 'inesperado.
4- performances e happenings.
Apesar de ser definida por alguns historiadores como um sinônimo de Performance, o happening é diferente porque, além do aspecto de imprevisibilidade, geralmente envolve a participação direta ou indireta do público espectador. Para o compositor John Cage os happenings eram "eventos teatrais espontâneos e sem trama".
O happening surgiu em Nova York na década de 1960, em um momento em que os artistas tentavam romper as fronteiras entre arte e a vida. Sua criação deve-se inicialmente a Allan kaprow, que realizou a maioria de suas ações, procurando a partir de uma combinação entre “assemplages” ambientes e a introdução de outros elementos
Inesperados, criar impacto e levar as pessoas a tomar consciência de seu espaço, de seu corpo e de sua realidade.
Na década de 1960 e 70, a arte alarga tanto suas fronteiras e muda tão completamente
Suas regras que permite o desenvolvimento de uma relação totalmente nova entre o artista e o corpo: surge a body art, decretando o corpo o suporte da obra de arte.
O corpo do artista passa a servir de lugar, de suporte, ainda que efêmero, para a arte. A relação espectador/obra assume novos aspectos quando a arte sai do espaço habitual dos museus e galerias para acontecer também no espaço urbano, na paisagem, na natureza.
O corpo antes apenas objeto de representação, é deslocado de sua função e, então convertido em material de trabalho. Submetido as mais diversas experimentações, Suscita um misto de atração e repulsa.
Operando na contramão do ideal clássico de arte, a body art convida a reflexão.
5- Land art.
A Land Art, [arte da terra] também conhecida como Earth Art ou Earthwork é o tipo de arte em que o terreno natural, em vez de prover o ambiente para uma obra de arte, é ele próprio trabalhado de modo a integrar-se à obra.
A land art inaugura uma nova relação com o ambiente natural. Não mais paisagem a ser representada nem manancial de forças passível de expressão plástica, a natureza é o lugar onde a arte se enraíza.
No final dos anos 60, um número de artistas inicia fora das quatro paredes da galeria, uma serie de trabalhos realizados fora do atelier,em desertos, lagos secos ou florestas, destinados a durar pouco com ausências de espectadores. As obras chegam aos museus e galerias na forma de fotos, mapas, vídeos ou filmes.
Richard Long e Robert Smithson trabalhavam com esse sentido letal do fazer. Concebiam intervenções em paisagens que o tempo tratava de apagar. Enquanto a obra deteriorava-se surgiam novas conformações, novas obras. Eles trabalhavam com o inconsumível e se questionavam onde a arte poderia aparecer.
Robert Smithson, além de sua importância às intervenções na natureza, foi um criador de conceitos, dentre os quais o de dislocation, ou deslocação, que se pode compreender como algo originalmente ligado à visão, mas que evoca igualmente descentramento, fragmentação, decomposição.
6-Hélio Oiticica e Ligia Clark.
O processo gradativo e lógico de abertura das propostas de Hélio Oiticica vai desde a representação abstrata até a negação radical da integridade física da obra.
O quadro fixo a parede, se desprende tornando-se visível bilateralmente e em seguida assumindo formas geométricas mais complexas. Esse processo marca a passagem do plano ao espaço, o fim do quadro e inicio de uma participação ativa do espectador. O individuo deve se mover, circular a obra para apreendê-la totalmente. O artista propõe então mais que uma experiência ótica e racional, uma experiência psíquica e física.
Nos Parangolés, capas e estandartes constituídos de diversos tipos de materiais e tecidos, Oiticica propõe ao participante levar a obra, vestindo-a e servindo como estrutura para tal. Aberta, ela representa o comportamento do participante no espaço público. A participação atinge o plano coletivo e torna-se fundamental já que a composição da obra depende da experimentação do objeto. A partir daí a valorização do corpo e das sensações torna-se uma preocupação principal. Sugerindo experiências desde a manipulação até o envolvimento completo, Oiticica cria proposições plurisensoriais e desenvolve a participação ativa.
Sempre mantendo diálogo com a obra de Lygia Clark, Hélio Oiticica escreve, em 1967, o texto "Aparecimento do suprasensorial", em que destaca um “novo comportamento
perceptivo” na arte brasileira. O suprasensorial seria “a tentativa de criar por proposições cada vez mais abertas, exercícios criativos” dirigidos aos sentidos, pois apelam o olfato, o paladar, a audição e o tato, “para através deles, da percepção total, levar o indivíduo a uma “suprasensação” ao dilatamento de suas capacidades sensoriais habituais.”
Nesse texto, destaca as “ousadas proposições criativas” de Lygia Clark como decisivas para acompreensão desse fenômeno.
A invenção dos“objetos relacionais” de Lygia Clark é o meio achado para reviver a sensibilidade posta de lado e para estabelecer novos contatos com os outros; criação artística como uma experiência dinâmica, inventada pela artista para alcançar o conhecimento-reconhecimento de si e do outro.
A partir dessa descoberta, Lygia Clark passou a reunir um grande número de materiais
sem nenhum valor, mas que proporcionavam, pelo toque, uma “redescoberta tátil” que
“provocava um trauma estimulante”. Nesse sentido, começa a produzir inúmeras
propostas novas que chama de Nostalgia do Corpo.
A fim de acordar o corpo do espectador, Lygia Clark propõe, também, vestimentas que condicionam os movimentos do corpo do participante, máscaras que introduzem sensações sonoras e olfativas ao olhar cego do espectador e ambientes-instalações onde a obra se faz; em um percurso de estímulos sensoriais, além de uma infinidade de outras experiências difíceis de descrever.
Ao integrar o objeto ao sujeito para criar a obra, Lygia Clark descobriu as vantagens de
chamar o corpo do espectador por inteiro para participar dessa jornada ao sensível
7-intervenções urbanas.
Na segunda etapa do projeto tendo como base teórica todos os deslocamentos e decomposição efetuados pala arte no espaço da representação, evidenciam-se novas possibilidades para observação de um objeto no espaço urbano.
Nosso primeiro objetivo é pensar o território, o espaço urbano como um texto a ser lido, seus elementos, casas, terrenos, letreiros, pontos comerciais, são pontuações dessa frase.
Lembramos que para Delacroix a natureza é “apenas um dicionário que fornece as entradas e nada mais”.
O conhecimento do espaço determinado se faz necessário, para entender-lo com uma rede de signos, como um sistema de objetos significantes, onde cada componente tem seu significado elaborado e socialmente compartilhado a partir de suas relações com e dentro do espaço.
A partir desta experiência, o espaço passa a ser explorado, construído, habitado, enquanto movimentos de intervenção, interação, percepção, entre sujeitos e objetos.
Com destaque para os conceitos de deslocamento e acaso, pensamos efetuar uma ação
A partir de um percurso pela cidade onde serão extraídos objetos, relatos e memória.
O deslocamento também transforma objetos comuns em obras de arte, propondo um diálogo entre espaço e tempo. Transformar o mercado de alimentos em mercado de arte é deslocar as coisas de seu lugar de conforto, além de transformar conceitos.
As visitas aos locais serão feitas a pé. É fundamental caminhar para adquirir a experiência de um lugar específico, a apreensão dos arredores e um sentido intensificado de presença individual que transcende a percepção visual, mas, Levando em conta as limitações somente deste procedimento, propomos que as visitas e os encontros teóricos sejam registrados através de texto, vídeo e da fotografia.
A expedição que faremos a um local determinado tem como objetivo recolher objetos, relatos, fatos etc. que sejam interessantes ao nível formal, social psicológico, sentimental, político ou histórico, a partir da colheita deste material pensaremos uma estratégia de intervenção em um determinado espaço, para esta determinada intervenção se faz necessário uma reflexão tanto formal quanto social deste espaço que abrigarar esta ação.
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